Para quem olha de longe, uma cidade pequena parece imóvel, como uma fotografia antiga esquecida na parede da sala. Mas quem viveu nela sabe: o movimento não está apenas nas ruas cheias, e sim nos encontros, nos sons, nos rituais repetidos que dão sentido aos dias. Santana do Ipanema, no sertão alagoano dos anos 1960 e 1970, nunca esteve parada. Ela pulsava — do seu jeito.
Para uma criança daquele tempo, o mundo era grande mesmo
cabendo em poucas quadras. O sino da igreja marcava as horas, o rádio
atravessava as paredes das casas, a feira mudava o ritmo das manhãs, e o Cine
Alvorada acendia sonhos quando a noite chegava. No começo, eram as películas
americanas, imagens distantes de outros mundos. Mas, nos anos 1970, algo mudou.
O cinema deixou de ser apenas tela e virou palco.
Quando seu Tibúrcio passou adiante o Cine Alvorada e
Paulo Ferreira abriu as portas para os programas de auditório de domingo,
Santana ganhou um novo coração cultural. A cidade inteira parecia caber ali
dentro. Crianças com os olhos atentos, adolescentes cheios de expectativas,
adultos orgulhosos de ver os seus brilharem sob as luzes do palco. Cantores
amadores, bandas formadas por jovens santanenses, desafios improvisados, humoristas,
dançarinas, mágicos — tudo tinha espaço. Tudo era aplauso.
Para uma criança sentada nas primeiras fileiras, aquele
não era apenas um espetáculo. Era uma escola invisível. Aprendia-se a ouvir, a
respeitar quem estava no palco, a perder e ganhar em público, a rir de si
mesmo, a admirar o talento do outro. Aprendia-se que a cidade era feita de
gente, e que cada pessoa tinha algo a oferecer. As homenagens do Dia das Mães,
as gincanas, as brincadeiras coletivas ensinavam afeto, pertencimento e gratidão
— lições que nenhum livro sozinho conseguiria ensinar.
E quando artistas de alcance nacional, como Antônio
Marcos e Cláudia Barroso, subiam ao palco do Cine Alvorada, Santana sentia que
o mundo também passava por ali. A cultura não era coisa distante das capitais;
ela estava presente, viva, acessível. Entre o rádio que já fazia parte do
cotidiano, a televisão que chegava devagar e as festas tradicionais de
padroeira, os programas de auditório completavam o ciclo da alegria coletiva.
A cultura, naquele tempo, não era luxo. Era necessidade.
Era o fio que ligava gerações, que dava sentido às lembranças e moldava o
caráter das crianças que cresciam vendo, ouvindo e participando. Uma cidade
pequena tem muitos movimentos — alguns quase invisíveis para quem passa rápido.
Mas eles ficam marcados para sempre em quem viveu. Santana do Ipanema se movia
assim: em aplausos, em risos, em músicas desafinadas e cheias de verdade. E
cada criança presente levava um pouco disso para a vida inteira.

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