Quando setembro se aproximava, Santana do Ipanema mudava de ritmo. O calor parecia menos severo, as janelas ganhavam cores novas e o cheiro de tinta fresca se misturava ao de bolo de milho e café torrado. Era o tempo da Festa do Feijão, o momento mais esperado do ano — quando o povo sertanejo deixava por um instante o peso da lida e se vestia de alegria. Na véspera, as ruas eram varridas, os muros caiados e as bandeirolas coloridas tremulavam com o vento que soprava do rio. Desde cedo, os moradores se alinhavam nas calçadas, com cadeiras de madeira, sombrinhas e olhos brilhando de expectativa.
Lá vinha o desfile dos carros alegóricos, abrindo a manhã
de festa.
Os carros, enfeitados com palhas, grãos e flores do
campo, contavam histórias do sertão: o plantio, a colheita, o trabalho do homem
e a generosidade da terra. No maior deles, a Rainha do Feijão surgia em trajes
majestosos, com uma coroa feita de palha trançada e sementes douradas. Sorria e
acenava para o povo, representando a fartura e a esperança que todo sertanejo
carregava no peito.
As escolas da cidade davam o tom educativo e cultural ao
desfile. O Grupo Escolar Padre Francisco Correia trazia crianças vestidas de
agricultores, cantando versos sobre o ciclo da lavoura e o valor da terra. A
Escola Estadual Professor Deraldo Campos vinha com um carro alegórico que
mostrava o plantio do feijão — pequenos lavradores empunhando enxadas de
madeira, simbolizando o esforço e o amor ao campo. Logo atrás, o Grupo Escolar
Ormindo Barros encerrava o cortejo com danças e dramatizações sobre o Rio
Ipanema e a vida simples do povo de Santana.
Entre os carros alegóricos, vinham os plantadores de
feijão de verdade — homens e mulheres com seus chapéus de palha, chapéus de
couro, enxadas e foices reluzindo ao sol. Alguns empurravam máquinas manuais de
plantação, outros conduziam carros de bois decorados com bandeiras e ramos
verdes. Eram os verdadeiros protagonistas da festa, os que faziam nascer da
terra seca o alimento que unia a cidade.
O povo aplaudia, sorria, se emocionava.
As crianças corriam atrás dos carros, os comerciantes
distribuíam caldo de cana, bolo de goma, amendoim e café. Havia música, cheiro
de comida e um sentimento coletivo de orgulho — como se a vida inteira do
sertão estivesse ali, condensada num único dia.
Quando o último carro passou, o céu começou a mudar.
Nuvens pesadas se formaram no alto da serra, e uma brisa
fria desceu pela avenida. As primeiras gotas de chuva caíram devagar, como
bênção, sobre o povo que ainda permanecia nas calçadas, olhando para o alto e
sorrindo. Era como se a própria terra respondesse à festa, agradecendo pelo
reconhecimento.
E assim, entre o som do tambor e o cheiro de chão
molhado, a Festa do Feijão encerrava mais um ano. Deixava no coração do povo
uma certeza antiga e terna: no sertão, tudo passa — menos a fé, o trabalho e a
alegria de celebrar o que nasce da terra.