Os anos passavam, e parecia que certos momentos em Santana do Ipanema se recusavam a ir embora. Eram lembranças vivas, como brasas que nunca se apagam. A cidade inteira respirava tradição, e havia quem dissesse com firmeza:
— É preciso guardar
dinheiro para as quatro festas do ano!
E assim era. As costureiras já sabiam que, naqueles
meses, o sono seria luxo. As máquinas de costura chiavam noite adentro, e o som
dos pedais era quase música de trabalho. As mães, com a revista Manequim aberta
sobre a mesa, escolhiam os modelos das roupas novas — vestidos rodados, camisas
de gola firme, laços e fitas coloridas. Os armarinhos se enchiam de vida:
botões, linhas, fitas e tecidos iam trocando de mãos, tecendo também os sonhos
de cada família.
Das quatro festas, nenhuma era mais esperada que a de São
João. Desde o começo de junho, o cheiro de lenha e de milho verde já anunciava
o que vinha. Os homens se reuniam para buscar madeira no mato e erguer as
fogueiras na porta de casa, cada uma mais alta e bonita que a outra. As
mulheres, animadas, iam à feira: voltavam empurrando carroças cheias de espigas
de milho — era milho pra pamonha, pra canjica, pra bolo e pra assar na
fogueira.
Os fogueteiros da cidade — como Zuza e a família de
Vicença — passavam dias preparando bombas, traques e chuvinhas. Sabiam o gosto
que o povo tinha pelo barulho e pelo brilho. Moacir, o dono do parque, chegava
com Seu caminhão cheio de brinquedos: a roda-gigante girava lenta, iluminando o
céu de cores que pareciam estrelas caídas; o carrossel tocava sua música
encantada; o barco-voador fazia os mais corajosos gritarem de alegria.
E ninguém esquecia a “mulher que virava macaco”, atração
esperada, que metia medo e arrancava gargalhadas das crianças.
Na rua de São Pedro, ponto alto da cidade, ficava a casa
de seu Pimpim — sapateiro conhecido e respeitado, homem de fala mansa e mãos de
ouro. De sua calçada, ele via o vai e vem do povo, o brilho das fogueiras, o
colorido das bandeirinhas e as crianças correndo com chuvinhas nas mãos,
desenhando rastros de luz no escuro.
A missa de São João reunia famílias inteiras. Depois,
todos voltavam para acender suas fogueiras. Sentavam-se ao redor, contavam
histórias, assavam milhos e riam alto. E quando o fogo baixava, começava a
brincadeira de pular a fogueira — um segurando na mão do outro, com coragem e
alegria.
Era nessa hora que muitos
selavam laços eternos:
— São João disse, São
Pedro confirmou, nós somos compadres em Nosso Senhor! — diziam, rindo e se
abraçando.
E assim nasciam compadrios que duravam a vida inteira.
A noite terminava em cheiro de fumaça, risos espalhados e
corações quentes. As estrelas, lá no alto, pareciam brilhar um pouco mais sobre
Santana do Ipanema. E quem viveu aquilo nunca mais esqueceu — porque certas
festas não terminam, apenas mudam de tempo.
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